Congresso derruba veto de Bolsonaro à desoneração

05/11/2020

Fonte: Folha de S.Paulo


O Congresso derrubou nesta quarta (4) o veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à prorrogação até dezembro de 2021 da desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia.

O veto foi derrubado por quase unanimidade dos senadores presentes. Foram 64 votos a favor da derrubada -eram necessários 41 votos, o que representa a maioria absoluta na Casa. Só dois senadores votaram pela manu tenção.

Situação semelhante ocorrera mais cedo na Câmara, onde foram 430 votos a favor da derrubada do veto e apenas 33 contra. Naquela Casa, eram necessários 257 votos para que o veto caísse.

desoneração da folha de pagamento para esses setores, que empregam 6 milhões de pessoas, será mantida até dezembro de 2021.

Na saída da sessão na Câmara, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), falou que o veto foi derrubado seguindo um período de maturação e conciliação.

"De fato, o governo tinha vetado esse artigo dessa proposta, que foi inclusive inserida na tramitação da matéria na Casa, e a partir daí se iniciou um debate sobre a importância dessa desoneração para esses setores fundamentais, que geram em torno de 6, 7 milhões de empregos no Brasil", disse.

"Nós estamos na pandemia, o Brasil está perdendo muitas vidas, e a gente não pode perder empregos. O emprego é fundamental para o crescimento econômico, ainda mais em um momento como esse, conturbado, que estamos vivendo." Segundo ele, quando decidiu vetar o dispositivo que prorrogava a desoneração, a visão do governo era outra. "E agora, na sessão do Congresso hoje [quarta], tivemos a orientação do governo para derrubada do veto do governo." A medida beneficia companhias de call center, o ramo da informática, com desenvolvimento de sistemas, processamento de dados e criação de jogos eletrônicos, além de empresas de comunicação, companhias que atuam no transporte rodoviário coletivo de passageiros e empresas de construção civil.

A derrubada do veto foi acertada em uma reunião virtual entre os líderes do Congresso. O próprio governo admitiu na ocasião que não contava com votos suficientes para manter o veto e passou a recomendar a derrubada.

O encontro foi chamado e conduzido pelo líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO).

O senador afirmou mais cedo, durante sessão da Câmara, que o próprio governo viu a necessidade de derrubar o veto.

Ele afirmou que, no bojo do acordo da desoneração, vem a manutenção de vetos importantes, entre eles um à ampliação do BPC (benefício assistencial para idosos e deficientes pobres).

"E uma medida necessária, mas não é fácil, porque o governo entende que, legalmente, está abrindo mão de receita sem apontar fonte segura. E todos sabem a situação fiscal do país", alertou.

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), foi o único líder a manifestar posição contrária à derrubada do veto, apesar de encaminhar a votação a favor do acordo firmado no dia anterior para a votação.

Bezerra afirmou que pode haver vício de inconstitucionalidade na manutenção da desoneração até o fim do próximo ano. Bezerra argumentou que há uma manifestação nesse sentido do ministro Bruno Dantas, do TCU (Tribunal de Contas da União).

desoneração da folha, adotada no governo petista, permite que empresas possam contribuir com um percentual que varia de 1% 34,5% sobre o faturamento bruto, em vez de 20% sobre a remuneração dos funcionários para a Previdência Social (contribuição patronal).

A medida representa uma diminuição no custo de contratação de mão de obra.

O incentivo tributário, porém, tem previsão de término em 31 de dezembro de 2020.

Empresários desses setores dizem que não suportariam esse aumento de custo. Segundo eles, 1 milhão de pessoas poderiam perder o emprego. "Um aumento de 0,01% nos custos é impensável neste momento, quanto mais quando a perspectiva é de 7% de aumento para nosso setor", diz Vivien Mello Suruagy, presidente da Feninfra (Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infra-estrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática), entidade que representa 137 mil empresas.

 

Vivien Mello Suruagy afirma que, caso a desoneração não fosse mantida, o setor deixaria de investir R$ 3 bilhões nos próximos anos. A federação também estima que 300 mil pessoas pudessem perder seus empregos.

Por ampla maioria, o Congresso aprovou, em junho, projeto que adia o fim da medida para dezembro de 2021. Bolsonaro, porém, vetou a decisão. O governo conseguiu adiar essa discussão desde o começo do segundo semestre.

A votação era dúvida por causa de um embate envolvendo a sucessão à Câmara dos Deputados.

Na Casa, há uma disputa de poder envolvendo o líder do centrão, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente da Casa, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). As votações na Câmara estão travadas há semanas.

O atraso na decisão sobre o veto, porém, começou antes da briga na Câmara.

Ainda em julho, o Ministério da Economia prometeu apresentar uma medida que atenderia um desejo do titular da pasta, Paulo Guedes: uma ampla desoneração da folha (não apenas para alguns setores), e, em troca, um novo imposto seria criado para bancar a redução nos encargos trabalhistas.

Líderes do governo no Congresso então atuaram para que a votação do veto aguardasse o movimento de Guedes. Mas, até hoje, a equipe econômica não apresentou uma solução.

Interlocutores de Bolsonaro então passaram a admitir a derrota.

Com a derrubada do veto, os congressistas terão de ajustar as contas do próximo ano.

O projeto de Orçamento de 2021 já prevê um gasto de R$ 3,7 bilhões com a desoneração da folha de pagamento desses setores. Isso acontece porque, mesmo com o fim previsto para dezembro de 2020, a medida gera efeito nos encargos a serem pagos nos quatro primeiros meses do próximo ano.

Assim, o custo adicional da prorrogação do incentivo fiscal seria de R$ 4,9 bilhões no Orçamento de 2021.

Sem o corte proporcional de despesas, o governo estouraria o teto de gastos. Com isso, haveria descumprimento da regra prevista na Constituição, que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior.

Interlocutores do Planalto tentaram usar essa discussão para acelerar a votação da PEC (proposta de emenda à Constituição) Emergencial, que autoriza o acionamento de medidas temporárias, como corte de salário e jornada de servidores, em momentos de crise nas contas públicas.

A ide ia era incluir na PEC Emergencial um artigo que deixaria claro que a desoneração da folha poderia, sim, vigorar por mais um ano.

Auxiliares de Guedes defendiam que ampliar os benefícios tributários, com a derrubada do veto seria uma medida inconstitucional.

O argumento é que, desde novembro do ano passado, quando entrou em vigor a reforma da Previdência, fica proibido conceder novos descontos que reduzem a arrecadação do fundo que banca as aposentadorias do setor privado.

O governo, então, abriria mão da disputa sobre a desoneração e, em troca, aceleraria a votação da PEC Emergencial, após as eleições municipais, de novembro.

Nesta quarta, dentro do mesmo veto, os deputados retomaram dispositivos sobre novas regras para participação nos lucros. Se a empresa decidir pagar a participação em parcela única, o acordo deve ser fechado até 90 dias antes.

Também derrubaram o veto que invalidava pagamentos de PLR que ocorressem em mais de duas vezes no mesmo ano ou em periodicidade inferior a um trimestre. Isso acontece para que o valor não configure salário.

Os deputados também rejeitaram outro veto de Bolsonaro a outro projeto. O dispositivo retomado suspendia por 120 dias a obrigatoriedade do cumprimento das metas e dos requisitos quantitativos e qualitativos pactuados pelos entes federativos com a União no âmbito do SUAS (Sistema Único de Assistência Social). A derrubada também foi confirmada pelos senadores.

STF forma maioria contra cobrança de ICMS de softwares-

Supremo formou maioria nesta quarta-feira (4) para vedar a cobrança de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre operações envolvendo softwares.

A corte entendeu que nesses casos a incidência tributária se restringe ao ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza).

O julgamento é importante porque deve ter impacto sobre o preço de diversos produtos oferecidos via novas tecnologias, como Netflix, Spotify e serviços de streaming.

Os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio afirmaram que os softwares são disponibilizados pela internet, sem cessão definitiva para o consumidor e sem mudança de titularidade do bem.

Assim, não está caracterizada a circulação de mercadoria a justificar a cobrança de ICMS.

Deles, cinco se posicionaram para que o entendimento só valha daqui para afrente.

O presidente da corte, Luiz Fux, pediu vista e afirmou que levará o caso a julgamento novamente na próxima semana. Comisso, esse pode ser o primeiro caso a ser enfrentado pelo novo ministro, Kassio Nunes Marques, na corte.

"É uma medida necessária [a derrubada do veto à desoneração], mas não é fácil, porque o governo entende que, legalmente, está abrindo mão de receita sem apontar fonte segura. E todos sabem a situação fiscal do país" Eduardo Gomes (MDB-TO) líder do governo no Congresso