Transporte urbano em São Paulo: uma viagem no tempo

26/01/2023

Fonte: O Estado de S.Paulo 

 

"A eletrificação do transporte por ônibus, principalmente nas grandes cidades, caminha a passos largos e já é uma realidade irreversível. Por força dos contratos de concessão e da Lei Municipal 16.802/2018, as empresas operadoras da cidade de São Paulo começam a substituir, gradativamente, os ônibus a diesel por veículos menos poluentes. Ônibus movidos a gás biometano e elétricos a bateria são as tecnologias que podem ser consideradas prontas para uso imediato. Os movidos a biocombustíveis (diesel verde) e os a célula de hidrogênio ainda carecem de estudos e testes de campo mais aprofundados. 

Essa mudança tecnológica do perfil da frota paulistana reforça o histórico papel de São Paulo em buscar avanços nos serviços de transporte de passageiros, desde 1890, quando a cidade ganhou a primeira linha de bonde elétrico, serviço assumido, em 1901, pela empresa canadenseThe São PauloTramway, Light and Power Company, à época, responsável pela distribuição de energia elétrica na capital paulista.

Até 1946, o transporte paulistano era feito por bondes, operados pela empresa canadense, e por ônibus - a maioria importados - de empresas autorizadas pela prefeitura para realizar o transporte de passageiros. Em 1947, foi criada a Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC), com o propósito de assumir os serviços de transporte realizados por 730 bondes, bem como operar 770 ônibus, a maioria de empresas privadas que foram encampadas.

Em 1977, a prefeitura reorganizou o sistema de ônibus, dividindo a cidade em 23 áreas, operadas por menos de 40 empresas concessionárias. Naquele mesmo ano, foi criada a Diretoria do Sistema de Trólebus na CMTC, responsável pelo desenvolvimento de uma nova geração de ônibus elétricos para a cidade de São Paulo, que passou a operar a ligação da Vila Prudente ao Parque D. Pedro II, em 1980.

Outra inovação implementada em São Paulo foi a Lei Municipal 11.037, de 1991, conhecida como a Lei da Municipalização, que atribuiu à CMTC a função de operadora exclusiva do sistema de transporte por ônibus e a autorizou a contratar empresas privadas para a operação de serviços complementares. Foram contratadas 37 operadoras, por um período de oito anos, em um modelo que permitiu a separação da tarifa de remuneração, que cobre os custos da produção dos serviços, da tarifa de utilização, valor pago pelo passageiro para usar os serviços.À época, já se discutia a adoção daTarifa Zero na cidade.

Se, por um lado, a Lei da Municipalização trouxe avanços aos serviços de transporte, por outro, não sanou as deficiências da CMTC, acumuladas nos seus 45 anos de existência - muito em função da orientação política dos prefeitos,da disposição de reajustar tarifas para cobrir os custos de produção dos serviços e da disponibilidade de recursos financeiros para a aquisição de novos veículos e manutenção da frota existente e para a conservação das garagens, abrigos, pontos de parada e redes elétricas. Problemas que levaram à sua privatização, em 1995, e à criação da São PauloTransporte S/A (SPTrans).

Melhoras serviço de passageiros

Novas inovações ocorreram em 2004, com a implantação do sistema de bilhetagem eletrônica e o lançamento do Bilhete Único, cartão com chip para carregamento de créditos eletrônicos, mais um marco no sistema de transporte público da cidade de São Paulo.

Em 2018, a prefeitura realizou um novo processo licitatório que culminou na contratação, em setembro de 2019, de 24 concessionárias que operam uma frota de quase 14 mil ônibus, divididos em três subsistemas: Estrutural, Articulação Regional e Distribuição Local. A remuneração das concessionárias continua sendo calculada com base nos custos de produção dos serviços.

No entanto, uma fórmula paramétrica considera os custos fixos e variáveis e demais despesas para o pagamento dos serviços prestados pelas concessionárias, individualmente.

A cidade de São Paulo mantém a prática da separação das tarifas - a de remuneração diferente da de utilização - e, no final de 2022, a prefeitura determinou a realização de estudos técnicos para verificar a viabilidade da implantação da chamadaTarifa Zero.A adoção dessa medida, para todo o sistema de transporte por ônibus, demandaria recursos orçamentários ou provenientes de fontes extratarifárias, que poderiam atingir até R$ 20 bilhões, por ano. Esse montante representa cerca de 20% do orçamento municipal.

Contudo, as mudanças tecnológicas no perfil da frota e a eventual adoção daTarifa Zero não são suficientes para possibilitar a prestação de um serviço de transporte com mais qualidade. Sem investimentos maciços em comunicação com o cliente e em infraestrutura - corredores, faixas exclusivas, terminais de integração, estações de embarque e desembarque, abrigos e pontos de parada e sinalização horizontal e vertical - para permitir um mínimo de efetiva prioridade ao transporte coletivo, não há o que falar sobre conquistar a satisfação dos passageiros. Esse é o grande desafio do transporte público por ônibus para os próximos anos."

Francisco Christovam- Presidente Executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU)