Comparação do Impacto do Gasto Mensal com Transporte Público nas Capitais Brasileiras e na América do Sul

20/02/2024

Fonte: Revista Autobus - ATIBAIA 

A maior parte dos sistemas de transporte público no Brasil depende exclusivamente da receita tarifária gerada pelos passageiros, o que torna o serviço caro e insustentável

transporte público desempenha um papel crucial na vida das pessoas, especialmente aquelas de baixa renda. O custo associado a esse serviço pode representar uma parte significativa do salário-mínimo, afetando diretamente a qualidade de vida dos cidadãos. Este estudo visa analisar e comparar o impacto do gasto mensal com transporte público nas capitais brasileiras e em outros países da América do Sul.

Foram coletados dados sobre o custo médio mensal do transporte público em cada capital brasileira e nos países da América do Sul, utilizando o Numbeo como fonte primária. Em seguida, calculou-se o percentual desse custo em relação ao salário-mínimo vigente em cada localidade, considerando que cada indivíduo utiliza duas passagens por dia durante o trajeto de ida e volta e 26 dias úteis no mês.

Além disso, foram consideradas as políticas de transporte público implementadas, como o Passe Livre do Trabalhador na Região Metropolitana de Goiânia.

Impacto nas Capitais Brasileiras

Segundo a Constituição Federal, o transporte público urbano é de responsabilidade dos municípios, que podem organizar e prestar o serviço de forma direta ou indireta, por meio de concessões à iniciativa privada. No entanto, há diferenças entre as cidades quanto à forma de financiamento, subsídio, integração e regulação do sistema.

A maior parte dos sistemas de transporte público no Brasil depende exclusivamente da receita tarifária gerada pelos passageiros, o que torna o serviço caro e insustentável. Algumas cidades, como São Paulo, Brasília e Goiânia, adotam políticas de subsídio público para reduzir o custo da tarifa ou manter o equilíbrio financeiro das empresas operadoras. Outras fontes de financiamento, como impostos, taxas e fundos, são pouco exploradas no País.

O subsídio público é uma forma de complementar a receita tarifária e garantir a acessibilidade e a qualidade do transporte público. Ele pode ser destinado ao custeio da operação, à manutenção da infraestrutura, à renovação da frota, à implantação de novos modais ou à concessão de benefícios tarifários, como gratuidades e descontos. No Brasil, existem 63 sistemas de transporte público por ônibus que possuem subsídios definitivos, que atendem 163 dos 2.703 municípios que possuem serviços organizados de transporte público por ônibus.

integração é uma forma de otimizar o uso do transporte público, permitindo que os passageiros possam utilizar diferentes modais ou linhas com uma única tarifa ou com descontos. Ela pode ser física, quando há terminais ou estações que facilitam a troca de veículos; tarifária, quando há uma padronização ou redução do valor cobrado; ou temporal, quando há um período de validade para a utilização de mais de um serviço. No Brasil, há poucas experiências de integração entre sistemas municipais, metropolitanos com destaque a Goiânia que é a única Rede Metropolitana de Transporte Coletivo de fato do Brasil.

A regulação é uma forma de estabelecer as regras e os parâmetros para a prestação do serviço de transporte público, definindo os direitos e deveres dos operadores, dos usuários e do poder público. Ela pode envolver aspectos como planejamento, fiscalização, controle, qualidade, tarifa, contrato, indicadores, penalidades, transparência e participação social. No Brasil, há diferentes modelos de regulação, que variam de acordo com o grau de autonomia, competência e estrutura dos órgãos reguladores, que podem ser municipais, estaduais ou metropolitanos.

Por fim, sobre a recuperação da demanda de transporte público após a pandemia, os dados da NTU - Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos - mostram que, em 2022, o setor registrou um aumento de 12,1% no número de passageiros transportados, em comparação com 2021, mas ainda não recuperou os níveis pré-pandemia. A demanda atual está em 82,8% do que era em 2019, antes da crise sanitária. Além disso, o setor acumula uma perda de quase R$ 40 bilhões e a redução de mais de 90 mil empregos diretos.

Neste sentido podemos comparar o impacto da tarifa na população das capitais brasileiras da seguinte forma:

Com base nos dados do Numbeo, foi constatado que Florianópolis e Curitiba destacam-se como as capitais brasileiras com maior impacto no salário-mínimo devido ao gasto com transporte público, representando 22,10% para ambas. Em contrapartida, Rio Branco e Macapá apresentam o menor impacto, representando respectivamente 12,89% e 13,63%. A Região Metropolitana de Goiânia ocupa a 10ª posição do ranking, com um impacto de 15,84% do salário-mínimo.

Comparação com Outros Países da América do Sul

transporte público na América do Sul varia muito de acordo com cada país, cidade e região. Alguns fatores que influenciam essa diversidade são: o tamanho e a densidade populacional, o nível de desenvolvimento econômico e social, a geografia e o clima, a cultura e a política, a disponibilidade de recursos e infraestrutura, e as preferências e demandas dos usuários.

De modo geral, podemos dizer que o Brasil se destaca por ter uma das maiores redes de transporte público coletivo (TPC) do continente, com mais de 300 mil quilômetros de extensão e cerca de 140 milhões de passageiros transportados por dia. O TPC no Brasil é predominantemente baseado em ônibus urbanos, que respondem por 85% das viagens realizadas. Outros modos de TPC presentes no Brasil são: metrô, trem, VLT, BRT, monotrilho, aeromóvel e teleférico.

Em comparação com os demais países da América do Sul, o Brasil apresenta algumas diferenças significativas, que podem ser positivas ou negativas, dependendo do ponto de vista. O Brasil tem a maior malha metroviária da região, com cerca de 430 quilômetros de extensão e 12 sistemas em operação. No entanto, esse número é muito inferior ao de países como China, Estados Unidos, Rússia e Índia, que possuem mais de 1.000 quilômetros cada. Além disso, o metrô no Brasil atende apenas 10 das 27 capitais estaduais e tem uma baixa cobertura e acessibilidade em relação à população urbana.

O Brasil foi o primeiro país da América do Sul a implantar um sistema de BRT (Bus Rapid Transit), que consiste em corredores exclusivos para ônibus articulados ou biarticulados, com estações de embarque e desembarque, integração com outros modos de transporte e controle operacional. O BRT é considerado uma solução de baixo custo e alta capacidade para o TPC e, atualmente, existem 39 sistemas de BRT na região, sendo 18 deles no Brasil. Porém, o BRT também enfrenta problemas como a superlotação, a degradação, a insegurança, a falta de manutenção e a resistência de alguns setores da sociedade.

A seguir apresentamos o levantamento feito sobre o impacto mensal do transporte no Salário Médio dos países da América do Sul

Ao comparar o Brasil com outros países da América do Sul, verificou-se que o Brasil está na 12ª posição do ranking, com um impacto médio de 16,32% do salário-mínimo com o transporte público. A Venezuela é o país mais impactado, com cerca de R$ 128,96 por mês para utilizar a locomoção, representando um impacto de 13,37%. Em contrapartida, a Argentina e o Equador têm o menor impacto, com 3,09% e 3,47%, respectivamente.

O Passe Livre do Trabalhador na Região Metropolitana de Goiânia

O Passe Livre do Trabalhador é uma opção inovadora de compra de vale-transporte na Região Metropolitana de Goiânia. Este programa proporciona aos trabalhadores liberdade de uso da rede de transporte durante todos os dias do mês, incluindo finais de semana e feriados, com desconto médio de 20% para empregadores que aderirem à assinatura mensal de transporte coletivo.

A nova Política de Tarifação, inaugurada pela Câmara Deliberativa de Transportes Coletivos (CDTC) e reformulada pela Lei Complementar Estadual nº 169/2021, busca promover uma ampla transformação do transporte público para facilitar o acesso e uso dos serviços com menores gastos. Empresas que aderem à nova modalidade adquirem as assinaturas por um valor unitário mensal fixo de R$ 180,00 por cada trabalhador.

O programa, em vigor desde 2022, beneficia mais de 55 mil trabalhadores em Goiânia. Iniciativa garante ao usuário do transporte coletivo o direito de fazer até oito viagens diárias no mês inteiro, inclusive em finais de semana e feriados. Modelo já conta com mais de 2,9 mil empresas cadastradas que economizam cerca de R$ 43 por mês com as passagens de ônibus.

Assim, os trabalhadores que fazem uso do Passe Livre do Trabalhador ocupam a primeira posição no ranking que lista as capitais com o valor do passe mensal mais barato do país, segundo o Mova-se Fórum de Mobilidade.

Conclusão

Na América do Sul, a carga tributária média é de 23% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados da OCDE. No entanto, há uma grande heterogeneidade entre os países, que reflete as diferenças nos níveis de desenvolvimento, nas estruturas produtivas, nas políticas fiscais e nas prioridades sociais. Os países que têm a maior carga tributária são Brasil (32,2% do PIB) e Argentina (31,3% do PIB), enquanto os que têm a menor é o Peru (16,1% do PIB).

A carga tributária afeta o transporte público de diversas formas. Por um lado, ela pode ser uma fonte de recursos para o financiamento da infraestrutura, da operação e da regulação do setor, bem como para a concessão de subsídios, incentivos e benefícios aos usuários e aos operadores. Por outro lado, ela pode ser um fator de encarecimento e de ineficiência do serviço, ao aumentar os custos de produção, de manutenção e de fiscalização, e ao gerar distorções, iniquidades e externalidades negativas.

Um dos problemas mais comuns na América do Sul é a alta tributação sobre o consumo, que representa cerca de 44% da arrecadação total na região. O consumo é a base mais utilizada para a cobrança de impostos sobre o transporte público, seja na forma de tarifas, de pedágios, de combustíveis ou de veículos. Esses impostos tendem a ser regressivos, ou seja, afetam mais as pessoas de menor renda, que gastam uma parcela maior de seus recursos com o transporte. Além disso, eles podem reduzir a demanda pelo serviço, gerar concorrência desleal com outros modos de transporte, como o automóvel, e estimular a informalidade e a sonegação.

Outro problema é a falta de harmonização e de coordenação entre os diferentes níveis de governo na regulação do transporte público. Na América do Sul, há uma diversidade de normas, de instituições, de competências e de interesses que dificultam a integração e a interoperabilidade dos sistemas de transporte, bem como a cooperação e o planejamento regional. Isso gera conflitos, sobreposições, lacunas e insegurança jurídica, que afetam a qualidade e a eficiência do serviço, e impedem o aproveitamento das potencialidades e das sinergias da infraestrutura regional.

O estudo destaca a significativa variação no impacto do gasto mensal com transporte público entre as capitais brasileiras e em comparação com outros países da América do Sul. A implementação de programas como o Passe Livre do Trabalhador demonstra ser uma estratégia eficaz para reduzir esse impacto e melhorar o acesso ao transporte público, contribuindo assim para a qualidade de vida dos cidadãos.

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